terça-feira, 29 de setembro de 2015

RIQUEZAS DA ÍNDIA PARA A EVOLUÇÃO HUMANA



O ser humano está em evolução, em transição entre o que já foi desde o início da espécie, até o homo sapiens que viveu há 160.000 anos. Nos nossos dias do antropoceno – o período em que nossa espécie predomina - ela provoca impacto crescente no planeta e no clima. O rumo da evolução daqui para diante será cada vez mais influenciado pelo comportamento de nossa espécie e, em última instância, por sua consciência. Se ela pressionar num rumo de ecocídio, poderá provocar seu próprio colapso. Se tomar juízo e relacionar-se de modo amigável e harmônico com o ambiente e o planeta - a mãe terra - poderá ter um futuro promissor. 
 
Nesse contexto se inserem as riquezas da Índia para a evolução humana. Riquezas de um povo não são apenas econômicas, financeiras, materiais, mas são também e principalmente as riquezas imateriais e intangíveis que criou e codificou, com as quais se guia na sua passagem pela terra. São riquezas filosóficas, de pensamentos e ideias, de práticas e cuidados com a saúde pessoal e ambiental. 

A Índia foi uma das duas grandes civilizações (a outra é a chinesa) que duraram mais de 4000 anos. Teve uma grande capacidade de resiliência, de responder positivamente às sucessivas ondas de invasões que sofreu em sua história. Desenvolveu um espírito de tolerância para com as diferenças, anfitrionando numerosos hóspedes que se instalaram no fértil subcontinente indiano. Para promover a coexistência pacifica entre esses diversos grupos, formulou e colocou em prática o princípio da não violência, ou ahimsa, aplicado por Gandhi para alcançar pacificamente a independência do país em 1947. Cultivou a unidade na diversidade, a consciência da unidade humana e dali brotaram diversas tradições sapienciais e espirituais. A psicologia indiana é sofisticada e o vocabulário de psicologia em sânscrito é muito mais rico do que aquele em grego ou em inglês, permitindo descrever estados de consciência de modo mais acurado. A cosmovisão indiana é ampla e seus mitos perduram por milênios. Sua concepção do que é o ser humano, com sua materialidade,  emoções, sentimentos, intelecto, o mental, a sua valorização do amplo espectro da consciência, do infra ao ultra consciente, ajuda a dar respostas  aos problemas de um mundo em conflito, limitado em seus recursos naturais.  Por meio do Yoga, ali inventado, consegue-se sintonizar um estado de consciência mais lucido e a meditação, ali codificada,  ajuda a compreender de modo mais abrangente o mundo e a si mesmo. O dharma, conceito central na Índia,  é a missão ou tarefa que cada indivíduo ou povo tem a desempenhar em sua vida. Ele não opõe direitos e deveres, que são ideias ocidentais; a dharmacracia é um modo de governo que aplica o dharma. Uma visão mundialista na política faz transcender os nacionalismos e o auto interesse estreito, colocando em primeiro lugar a saúde da mãe terra. O grande símbolo da Índia é a flor de lótus, que se alimenta do lodo embaixo, mas também da luz do sol que vem de cima. 

Sendo os dois maiores países tropicais do mundo, Brasil e Índia podem compartilhar muitos conhecimentos e o Brasil pode se beneficiar da sabedoria de sua irmã mais experiente. A capacidade antropofágica de digerir as influências de fora, o jeitinho ou jugaad, o clima, a ecologia tropical e o ambiente, a capacidade de criar e improvisar a partir de uma base material precária, a criatividade, alegria, espiritualidade e inteligência espiritual aproximam esses dois povos.

(x) Autor de Tesouros da Índia. www.ecologizar.com.br  Ecologizar@gmail.com

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Ecologizando a economia



Vivemos num pequeno planeta com limitada capacidade de suporte. O crescimento econômico ilimitado, baseado em consumo crescente de recursos naturais e produção de bens materiais pode produzir o colapso ecológico. A economia não pode continuar a fazer de conta de que não existem limites ecológicos na capacidade de suporte da Terra. 

Nos processos biológicos, muitas vezes o crescimento ilimitado constitui uma doença, como ocorre com a proliferação de células cancerígenas. O planeta não sustenta pressões ilimitadas e se defende por meio das mudanças ambientais e climáticas. Caso o modo de crescimento seja qualitativo, mais do que quantitativo e caso seja baseado em recursos renováveis, ele pode ser compatível com a capacidade do planeta por um maior período. Fritjof Capra e Hazel Henderson distinguem o crescimento quantitativo do crescimento qualitativo e defendem esse último.

Na relação da economia com as Ciências Ecológicas há a urgência de inverter posições. A economia é parte da ecologia, e não o contrário. A Ecologia é a teoria e a ciência primordial e a economia é uma de suas aplicações “A função da economia seria cuidar de nossas pequenas casas, aquelas que só podem perseverar em suas atividades se a teoria da grande casa – nosso planeta ou nossa biosfera – for capaz de abrigá-las” escreve Patrick Viveret, em Reconsiderar a riqueza, 2006. A economia precisa atuar considerando os processos, as potencialidades e limites ecológicos, para não agravar os colapsos ambientais e conseqüentes problemas sociais, o sofrimento humano, a produção de refugiados climáticos e os riscos políticos e à segurança.

Capra (2002), aponta que economia e ecologia têm metas distintas:
“Ao passo que o capitalismo global é composto de redes eletrônicas de fluxos de finanças e de informação, o projeto ecológico mexe com redes ecológicas de fluxos de energia e matéria. A meta da economia global, em sua forma atual, é a de elevar ao máximo a riqueza e o poder de suas elites; a do projeto ecológico, a de elevar ao máximo a sustentabilidade da teia da vida."

Para integrar as questões econômicas e ecológicas, é necessário o casamento entre as políticas ambientais e as econômicas. Economia e ecologia precisam caminhar na mesma sintonia e o sistema econômico precisa considerar as questões ecológicas. A Ecologia econômica é um dos muitos campos em que se desdobraram as Ciências Ecológicas desde os primórdios da Ecologia como um ramo da Biologia, no século XIX. Cabe ao campo da ecologia econômica:
• Promover a inclusão da economia na ecologia.
• Analisar os efeitos dos fenômenos ambientais e climáticos sobre os diferentes setores econômicos.
• Avaliar possibilidades econômicas e limites ecológicos dos ecossistemas.
• Avaliar criticamente modelos de desenvolvimento que desfiguram ecossistemas e colocam a vida em perigo.
• Conhecer os efeitos, sobre os recursos naturais, da pressão pela satisfação das demandas materiais.
• Desenhar modelos e indicadores para avaliar o uso econômico dos ecossistemas e dos recursos naturais renováveis e seus impactos sobre o meio ambiente natural e humano.
• Oferecer conhecimentos para conciliar demandas econômicas com a manutenção dos processos ecológicos vitais.
• Recuperar a ideia de fideicomisso, pela qual os cidadãos atuam como guardiões e protetores de ecossistemas, no interesse da evolução ecologizada, em nome dos cidadãos e as gerações futuras – hoje, governos e corporações representam interesses imediatistas e não representam as gerações futuras, os ecossistemas e as espécies não humanas. 

A natureza presta serviços ambientais ao reciclar nutrientes, produzir e purificar a água, fornecer oxigênio, sequestrar e reciclar o carbono, regular o clima e moderar o impacto de mudanças climáticas, manter e proteger a biodiversidade, reduzir perdas de solos e nutrientes, reduzir riscos de incêndios, contribuir para a beleza e a recreação. Caso não fossem prestados gratuitamente, teriam custo para a sociedade. A ecologia econômica propõe que sejam contabilizados e que sejam oferecidas compensações econômicas aos serviços naturais prestados pela natureza. 

Ecologizar a oferta é necessário porém insuficiente. Não basta a ecoeficiência, o aumento de produtividade, a redução de emissões de poluentes, as energias renováveis, o esverdeamento da construção civil, da produção de energia, do transporte, da agricultura. Isso é necessário, porem insuficiente caso não existam mudanças correspondentes no padrão de demanda e no comprometimento social e individual com atitudes e comportamentos ecologizados. Na economia, a formação da demanda tem um forte componente psicológico e cultural.

A crise climática oferece oportunidades para se redirecionar as demandas, as tecnologias e modos de produção em direção a uma economia ecologizada, de baixo carbono. Entretanto, para que essas oportunidades sejam aproveitadas, os tomadores de decisão, empresários, a sociedade civil e os governantes precisam ter uma mentalidade ecologizada. O déficit de formação, cultural, de percepção e de compreensão desses temas, precisa da Ecoalfabetização. Precisa conhecer o que são as ecologias, que se desdobram em muitos campos, a partir de sua origem nas ciências biológicas. 
Ecologizar a economia inclui ecologizar as crenças, os desejos, a educação e a cultura, internalizando os conhecimentos das ciências ecológicas nesses campos.



terça-feira, 8 de setembro de 2015

O gerenciamento integral do ciclo da água






As águas se interconectam na natureza. Evaporam com o aumento de temperatura, depois se precipitam como chuva, neve ou granizo; escorrem nas águas superficiais, se infiltram no solo e brotam em nascentes. As águas fluem em vasos comunicantes, aéreos, subterrâneos e superficiais.
A hidrosfera compreende as águas em estado sólido, líquido ou gasoso; águas subterrâneas, na superfície ou na atmosfera. A gestão integral do ciclo da agua vai além da gestão integrada de recursos hídricos superficiais e subterrâneos e inclui também aquilo que se passa quando ela se encontra na atmosfera. A gestão integral do ciclo da água demanda compreender as interconexões entre os vasos comunicantes do que ocorre quando ela escorre superficialmente, se infiltra nos solos e forma os lençóis de agua subterrâneos e se encontra em estado meteórico, de vapor na atmosfera.
Isso deve ser feito de preferência com números e séries históricas que deem embasamento às propostas. A falta de dados e informações não deve ser um pretexto para a inação, pois há princípios de prudência que precisam ser seguidos. A compreensão qualitativa do que ocorre no ciclo da água indica o rumo que as ações de planejamento e gestão devem tomar.
O conhecimento sobre o organismo da Terra e os ciclos biogeoquímicos permite compreender como fenômenos numa parte do globo afetam as demais. Assim, por exemplo, o fenômeno do El Nino, o aquecimento das águas do pacífico, influi diretamente sobre a distribuição de chuvas na América do sul, agrava secas no nordeste brasileiro e provoca inundações no sul do país. É crescente o conhecimento sobre a atmosfera, seu teor de umidade e o vapor d’água nela existente, sobre evaporação, evapotranspiração (a evaporação a partir das plantas).  Pesquisas que recenseiam as nuvens tais como o projeto Chuva, do INPE, permitem prever tempestades e simular impactos das mudanças climáticas.
A transposição de água de uma bacia para outra pode ser feita por meio de obras de infraestrutura de engenharia que transportam águas superficiais. Também é feita pela natureza por meio dos rios voadores, sendo a umidade do ar transportada pelas nuvens de uma região a outra, de uma bacia para outra.  Trata-se de um modo natural de transposição, econômico, sem demanda de energia. Esse modo está crescentemente influenciado por ações humanas ao desmatar, ao criar aglomerados urbanos, ao interferir sobre o ciclo da água e alterar os ciclos do carbono, do nitrogênio, do enxofre.
Os rios voadores que se formam a partir da umidade evaporada na Amazônia são essenciais para prover chuvas no centro-oeste e no sudeste brasileiro. O desmatamento na Amazônia afeta a disponibilidade de agua no sudeste, e a atuação sobre o desmatamento na Amazônia é parte integrante de uma gestão integral do ciclo da água.
Uma das formas de atuar sobre a água atmosférica é o bombardeamento de nuvens para precipitar chuvas. A revista Scientific American n.63, edição especial sobre água, tem uma matéria sobre o tema “Invocando Chuva”, por Dan Baum, que mostra a semeadura de chuva por meio de iodeto de prata Isso faz aglutinarem dentro das nuvens as pedras de gelo que se derretem ao caírem para regiões da atmosfera em que a temperatura é maior, formando chuvas ou tempestades de granizo, e nesse caso chegam ainda em estado sólido na superfície. Em países onde isso vem sendo usado, há consequências conflitivas. Na China por exemplo, isso gerou disputas entre províncias vizinhas, pois nuvens bombardeadas num estado vieram a chover em outro, devido aos movimentos dos ventos, subtraindo água de um deles em benefício do outro.
A gestão integral do ciclo da água exige ir além dos tradicionais instrumentos da gestão de recursos hídricos e usar instrumentos ligados a uma compreensão mais ampla do ciclo da água e das consequências que o desmatamento numa região pode trazer para a disponibilidade de água em outra região. Ela implica em atuar sobre a demanda por produtos, sobre a economia para reduzir as demandas excessivas de água que causam estresse hídrico, sobre a cultura e os hábitos alimentares e de vida. Para se lidar de modo integral com a gestão do ciclo da água, pode-se lançar mão tanto das geoengenharias e modos de interferir com a produção de precipitação de chuvas, como reduzir demandas por água nas diversas atividades econômicas, especialmente o consumo pelo usuário que mais a utiliza, a agricultura irrigada.  Ela pode envolver a produção de água, a recarga de aquíferos por meio de barraginhas e barragens subterrâneas. Pode envolver o controle da salinização e das cunhas salinas, nos locais em que elas interferem com a água doce.
A visão integral do ciclo da água ajuda se articular seu planejamento e gestão, numa perspectiva de longo prazo.