terça-feira, 17 de novembro de 2015

Ecologizar o capital: o investimento ético



Numa atividade econômica há múltiplas partes interessadas (stakeholders), conforme mostra a figura. Cada uma dessas partes tem interesses específicos e umas têm mais força do que outras para fazer prevalecer seus interesses. Os trabalhadores procuram maximizar seus salários e melhorar as condições e  a segurança de seu trabalho; as organizações comunitárias das vizinhanças procuram obter compensações e reduzir os  riscos e os danos que a atividade provoca no ambiente; os órgãos de governo licenciam e autorizam o funcionamento de empresas que geram empregos e renda, mas que também têm impactos negativos. Os investidores e acionistas têm interesse em maximizar o rendimento no capital que investem na empresa. Os dirigentes, presidentes, executivos e técnicos operacionalizam as ações da empresa, supervisionados pelos conselhos de administração.  
É desigual a força econômica, política e social de cada uma dessas partes interessadas. Com frequência prevalecem os interesses dos investidores ou acionistas, que orientam as ações operacionais das empresas.
Muitos investidores, grandes ou pequenos, escolhem onde investir baseados apenas nos critérios de rentabilidade e lucro do capital. Eles querem ter resultados financeiros e em geral estão alienados do modo como esse lucro é obtido.  A pressão dos acionistas incide sobre os diretores, gestores e executivos das empresas, que procuram atender suas demandas e responder às pressões por produtividade e lucro. Não por acaso as remunerações desses dirigentes dependem do resultado que produzam financeiramente. 
Em tal conjuntura, e no afã de agradar as expectativas dos acionistas, muitas vezes os executivos das empresas se empenham em reduzir custos. Ao faze-lo, consciente  ou inconscientemente, reduzem os controles e a prevenção ambiental, precarizam a segurança do trabalho, aumentando os graus de risco de que venha a ocorrer um desastre ou uma catástrofe ecológica ou social. Ao reduzir custos,  a gestão temerária costuma aumentar os riscos.
A gestão temerária pode resultar em desastres e catástrofes com alto custo econômico, social e ambiental e com sofrimento para a população e para o ambiente.
A catástrofe ou desastre é pedagógica para todos. No Brasil, desastres ecológicos despertam temporariamente para o tema; aprovam-se novas leis, aprimoram-se alguns procedimentos. Mas tudo tende a ser fogo de palha, pois em breve se esquece, a memória é curta. Outras tragédias aparecem e capturam mais uma vez a atenção pública. 
As tragédias também podem ser pedagógicas para os investidores ou acionistas, pois doem em seus bolsos, fazendo com que tenham prejuízos com seguros, indenizações, perda de valor das ações da empresa em que investiram.  
Por outro lado, também podem trazer-lhes o amadurecimento de escolherem como executivos das empresas pessoas que tenham visão estratégica de longo prazo e que não se contentem apenas com os lucros de curto prazo; executivos que evitem a gestão temerária que aumenta os riscos de desastres, com os prejuízos financeiros que os acompanham.
A gestão financeira de curto prazo frequentemente movimenta-se por critérios que camuflam os prejuízos coletivos no longo prazo. Quanto mais antiecológico, mais rentável um empreendimento pode ser, caso transfira seus ônus socioambientais para a sociedade.
Aí existe o divórcio entre os interesses coletivos de longo prazo e os interesses particularistas de curto prazo, sinais do descasamento entre ecologia e economia.
O investidor - o acionista de uma empresa, o detentor do capital –  atualmente é um ator frequentemente alienado das questões sociais e ambientais. O que o motiva é o retorno pelo seu investimento. Ele hoje é um agente que agrava aos problemas ecológicos mas que pode vir a ser um ator relevante para a ecologização da sociedade. Há um movimento de acionistas engajados (concerned shareholders) que procura transformar de dentro para fora das empresas as suas práticas, tornando-as social e ambientalmente mais responsáveis. As grandes corporações já foram descritas como instituições psicopatas, que se movem compulsivamente em função de seus interesses próprios, pouco lhes importando os interesses dos demais atores sociais ou do ambiente.(ver a esse respsito o documentário canadense de 2004,  The Corporation).
O investimento ético é uma boa opção escolhida por poupadores que aplicam suas economias em empresas, empreendimentos e projetos social e ambientalmente responsáveis. Algum volume de capitais tem migrado para os econegócios. Nos países em que existe forte poupança, os bancos e fundos éticos cresceram e se tornam mais rentáveis, à medida que a consciência ecológica dos investidores é fortalecida. Eles vetam a aplicação de recursos em empreendimentos destrutivos da vida humana, como a indústria bélica, pornográfica ou de tabaco. Mas ainda divergem em sua definição do que seja impacto ambiental, podendo investir, por exemplo em uma empresa mineradora ou de exploração petrolífera, que tem práticas agressivas ao meio ambiente.  
Ademais, o percentual de negócios ecologicamente responsáveis, proporcionalmente ao total das operações das empresas e instituições, é pouco e mal informado à sociedade, o que prejudica a credibilidade de suas iniciativas.
A vigilância dos investidores sobre empresas, bancos e fundos éticos é necessária para se evitar que gestores e banqueiros inescrupulosos ou que pratiquem ações contrárias aos princípios da ecologia integral se beneficiem da boa-fé e tirem vantagens dela.
A vigilância mútua entre as próprias instituições financeiras reduz os riscos de que se pratique uma concorrência desleal, que atraia simpatias e clientes com propagandas enganosas.
A adesão de bancos a princípios socioambientais, ainda que inicialmente não seja consistente com suas práticas, pode ser um passo para provocar neles um saudável contágio que leve à ecologização de seu comportamento. Para que isso ocorra, será essencial a vigilância da sociedade.

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